Eu não mudei. Não mudarei. Nunca das convicções, do sonho de, um dia, ver edificado um país novo, cidadão, igual, de justiça, verdadeiramente republicano, onde a ideologia de um partido, se subjugue aos órgãos de um sério Estado de Direito e Democrático. São princípios que entendo como nobres e que, calculo, devem fazer parte de todos quantos, cada um no seu meio, pretendem estar – ou passar – pela vida com o lema de que quem não vive para servir não serve para viver.
Por William Tonet
A utopia é um direito que me cabe no quadro dos Direitos Fundamentais de cidadão livre e apaixonado pela democracia participativa. Mas só o é, só o será, se me reconhecerem igualmente o direito de defender essa causa, tal como eu reconheço, aceito e estimulo direito igual aos que discordam de mim.
Nunca tive a pretensão de agradar a TODOS, pela incapacidade de satisfazer gregos e troianos, ao longo da minha curta, mas intensa vida de luta contra as injustiças. Se tivesse esse dom certamente nunca teria nascido. Quem nasceu e cresceu tem esse “defeito” genético de, por natureza, ser igual na diferença, ser diferente na igualdade.
Não me “masturbei intelectualmente” face às primeiras prisões de altos dirigentes do MPLA e do governo, acusados de crimes de corrupção. Se a procissão ainda vai no adro, se o padre ainda balbucia as últimas palavras de pregação, o melhor é ter calma pois – como se diz na universidade da vida – cabras apressadas parem os filhos defeituosos.
Mas isso não significa estar contra o combate a corrupção, o pior veneno dos governos do MPLA desde que a institucionalizou em 11 de Novembro de 1975, com a implantação das famosas lojas dos dirigentes (para os membros do comité central, do bureau político e quadros seniores do MPLA, que tinham tudo do bom e melhor do capitalismo) e as lojas do povo (onde o peixe podre e a fuba, não faltavam se refilares). Com essa discriminação (e não adianta mistificar ou tentar justificar o injustificável) foi lançada, adubada e multiplicada a semente da corrupção, pois o povão se quisesse comer queijo ou carne vazia tinha de trafegar “esquemas-mil”, para ter um cartão da loja dos dirigentes…
Sejamos, por isso, sérios, íntegros e sobretudo dignos. Como se pode ver, a corrupção não poderia ter ninguém melhor como pai da criança, se não o todo poderoso MPLA, detentor, desde 1975, das chaves dos cofres públicos e dos arsenais capazes de aniquilar (como aconteceu) todos quantos queriam apenas sobreviver alimentados pela força da razão.
Logo, combater a corrupção é uma decisão responsável, da qual nunca abdicarei, mas não baterei palmas por simples detenções, por força de decisões meramente políticas (eventualmente efémeras e paliativas), quando a eficácia exige a supremacia da lei, logo a reforma da norma jurídica, para todos estarem compenetrados dos limites e horizonte de navegação do ilícito criminal, pelo qual a espada da justiça deve baixar a sua força.
A corrupção é uma missão e a condenação dos corruptos, também. Agora, pouco importa, se é legal ou ilegal, justa ou injusta, a medida que conduziu os novos inquilinos da cadeia de São Paulo.
Por isso preferi a contenção (sempre boa conselheira) e rememorar o facto de elas terem resultado de uma vontade política, anunciada no dia 8 de Setembro, pelo novo líder do MPLA e não (como deveria ser) fruto de investigações nos marcos da imparcialidade da lei.
Não nego a importância do poder político num combate sem quartel contra a corrupção, mas depois dela, deve haver trilhos para os órgãos judiciais e judiciários, andarem sozinhos, com independência nos marcos da constituição e da lei.
Não condeno quem me apontou o dedo, mas estes têm, também, a obrigação de reconhecer que exigir, como o fiz, a alteração do paradigma legal, não é desistir do combate aos crimes de corrupção e de condenação exemplar aos corruptos, cuja prática há 43 anos vem matando a maioria dos autóctones. É que, convenhamos, cometer um crime para acabar com outro crime é tão-somente cometer dois crimes.
Fui e sou, ao longo da vida, um revolucionário identificado com a esquerda social, originando vários amargos de boca, num reino, cujos dirigentes se apresentaram, em 1975, como revolucionários, libertadores e proletários e, num toque de mágica, se tornaram proprietários vorazes, delapidadores do erário público, verdadeiros corruptos, uma quadrilha da pior espécie, que deveria ser extinta, pela força do voto popular do xadrez político.
É louvável a investida de João Lourenço, enquanto Presidente do MPLA e da República, mas não chegam, para apagar os malefícios da degradação do tecido material e humano, se não houver uma verdadeira reforma no sistema judicial e judiciário, sem qualquer interferência do poder político.
A tribo corrupta do MPLA roubava desbravadamente. Reconheçamos-lhes a honestidade “quadrilhal”, em nome de um só povo e duma só nação: a do MPLA, que, infelizmente, massacrava e prejudicava a maioria autóctone.
Agora, 43 anos depois, desmorona-se, melhor, implode, a quadrilha, face, ao desgaste de imagem, o crescendo de uma revolta social incubada, o desemprego galopante, a inflação e a descredibilização internacional.
Em função deste quadro, sem dólares no circuito bancário, uma dívida interna e externa galopante, encerramento de fábricas e serviços diários, quebra da economia, emerge João Lourenço, do mesmo clube, mas com espírito diferente, liderando uma verdadeira caça às bruxas, cujo fim, poderá ser, blindar o seu consulado e poder absoluto, totalíssimo, se não houver espírito republicano e envolvimento de outros autores políticos da oposição e sociedade civil…
No momento o mais estrondoso alvo é a corrupção. Os destinatários: dirigentes e militantes do MPLA, com ficha sujíssima e distantes da ala lourenciana.
Não está mal. É de louvar, qualquer combate contra a gigantesca roubalheira, mas se o SIC (Serviço de Investigação Criminal), o Ministério Público e os Tribunais não forem munidos de meios operacionais, técnicos e verdadeira independência funcional, nada se alterará, porque limitado o horizonte.
E aí, levanta-se a suspeição, sendo difusas as regras do jogo, muitas marginais à Constituição e à lei, por fidelidade a ideologia do novo senhor absoluto, tudo se confunde.
É preciso uma revolução no paradigma legal, capaz de mover investigações justas, para não parecer, mais um show-off da tribo partidocrata especializada, sempre que está em declínio, junto dos cidadãos, nestas maratonas de diversão política.
O combate à corrupção deve ser permanente e que João Lourenço amplie o raio de acção, da luta, para impedir ou dificultar a cultura do peculato, nos corredores do palácio e ministérios, moralizando o serviço público, mas tornando uma missão republicana o grande combate a corrupção, implantada pelo MPLA, cuja prática está a levar o país e cidadãos para o abismo.